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Hoffmann conta outro lado da F-1 nos anos 70, o da dificuldade

Lenda nos carros de turismo, o "Alemão" teve uma participação difícil nos GPs de 1976 e 1977, compartilhando sua visão com o TotalRace

Arte de Ingo Hoffmann com o carro que correu em 1976 (Totalrace)

Se for comparar a trajetória de minha carreira com a da grande maioria dos pilotos, percebo que fui totalmente na contramão, porém com muita velocidade. Digo isto, pois, já há muito tempo, praticamente todos os pilotos começam no kart, com seus nove ou dez anos. Quando tudo dá certo chegam à F-1 com seus 19, 20 anos; ou seja, levam em média uns dez anos para a realização do grande sonho.

Eu não comecei no kart. Por não ter tido a autorização dos meus pais, tive de completar a maioridade, tirar a carteira de motorista, em 1971, para, em 1972, já com 19 anos completos, fazer minha estreia no automobilismo com um Fuscão 1500, em uma prova no Autódromo de Interlagos para pilotos estreantes.

Nos anos de 1973 e 1974, corri aqui no Brasil, na Divisão 3 até 1600 cilindradas, e fui bicampeão, sendo que no segundo ano estreei na Fórmula Super Ve, mesma categoria onde estreava também Nelson Piquet. No ano seguinte, em 1975, fui correr na Fórmula 3 inglesa e, no segundo semestre, fui convidado pelo Wilson Fittipaldi para fazer dois testes no Copersucar Fittipaldi de F-1 e, em razão de ter ido muito bem nestes testes, a equipe me ofereceu um contrato para correr nos anos seguintes.

A primeira, das pouquíssimas corridas que fiz na F-1 (foram três, somente), aconteceu justamente no GP do Brasil de 1976, ou seja, quatro anos depois da minha estreia com o Fuscão 1500, um tempo recorde da estreia para chegada na F-1. E isso foi extremamente marcante para mim, pois ficava pensando: “Há pouco tempo, estava correndo aqui de Fusca, e agora estou num F-1, o sonho de qualquer piloto”. Eu tinha de me beliscar para saber que estava acontecendo de fato.

Sabia que não estava devidamente preparado para esta estreia na F-1, mas, pelo acordo que tinha com a equipe, o primeiro ano seria de aprendizado somente. Me lembro que não fiz o ultimo tempo no grid de largada e terminei a corrida na 11ª colocação, com o pescoço totalmente destroçado, por conta das características da pista e a total falta de condicionamento físico. Como era a corrida de estreia, achei o resultado bastante promissor.

Daí para a frente, as coisas não andaram como deviam dentro da equipe, fui em somente mais 3 GPs, dos EUA (em Long Beach), França (em Paul Ricard), e Espanha (em Jarama), sendo que em nenhum destes consegui me classificar para a largada.

No ano de 1977, voltei a correr no GP Brasil, com o FD04, o mesmo carro que Emerson usava. Estava ansioso por melhores resultados, mas como a equipe estava indo para o terceiro ano, tendo o Emerson como piloto e pouquíssimos resultados, a pressão estava grande em cima de todos, principalmente em cima dele, de forma quem durante os treinos, todas as atenções eram para ele. Teve um fato que aconteceu durante os treinos de sexta feira, que demonstra bem o clima que estávamos vivendo.

Meu carro não andava em linha reta, nas retas, de tanto que puxava para a direita. Comentei isso durante o treino com o Jo Ramirez, que era o chefe da equipe, e ele me respondeu: “Continua a guiar assim e nas retas você faz força no volante, na direção contraria, para manter o carro em linha reta!”

Naquele dia fiquei na pista até umas dez da noite, pedindo para checarem o meu carro e, depois de muita insistência minha, o carro foi colocado nas balanças e constatou-se que a distribuição de peso do carro estava totalmente errada. Com isso acertado, no dia seguinte consegui baixar meu tempo em quase dois segundos. Nesta corrida também não larguei em ultimo e terminei em setimo, sendo que estava em sexto quando, a poucas voltas do final, tive o azar de “ganhar” um micro furo no pneu traseiro esquerdo, fazendo com que perdesse a posição, a última que marcava pontos naquela época.

Neste mesmo ano de 1977, também participei do GP da Argentina, que na realidade era realizado antes da prova em Interlagos. Nos treinos desta corrida, que foi realizado sob uma temperatura altíssima, os nossos carros tinham um grande problema de superaquecimento.

Durante todos os treinos, todas as atenções estavam, mais uma vez, no carro do Emerson, no sentido de melhorar a refrigeração. A ordem que eu tinha era de ficar de olho no relógio da temperatura, e assim que a mesma chegasse no seu limite, tirar o pé do acelerador, dar umas voltas devagar, esperar ela baixar, para ai voltar a acelerar, com a promessa que na corrida meu carro também teria uma refrigeração melhor.

No dia da corrida, o carro estava exatamente do mesmo jeito, sem nenhuma melhoria na refrigeração do motor, e o pedido voltou a ser: olhar o relógio de temperatura = tirar o pé = esperar algumas voltas = voltar a acelerar.  Adivinhem o que aconteceu com o motor: superaqueceu e quebrou.

Achei até bom, pois tive um problema com o tímpano do meu ouvido esquerdo no começo da corrida. Em razão do altíssimo nível de ruído de um motor de F-1, e a total falta de protetores auriculares bons naquela época, o tímpano estourou de tal forma que, toda a vez que o motor do carro passava de uma certa rotação, meu equilíbrio era afetado e a pista na minha frente começava a balançar, como se fosse uma grande onda; no momento que eu tirava o pé do acelerador, a rotação instantaneamente baixava e a visão se firmava novamente. Pilotei assim por uma boa parte da prova, até o motor quebrar.

Hoje, quando olho para trás e analiso minha carreira, muitas vezes até me esqueço desta minha passagem pela F-1. Não guardo mágoas, nem nenhum tipo de ressentimento em relação à minha frustrada carreira de piloto de F-1. Costumo dizer sempre que a única vantagem que tive de ter participado em poucas corridas de F-1 é que eu pude incluir isto em meu currículo, o que acabou me ajudando muitas vezes na captação de patrocínio para minha carreira na Stock Car. 

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