Análise: GPs da F1 sem apoio governamental estão em risco pelo coronavírus

Pela primeira vez em 70 anos, o GP da Itália e outros GPs históricos estão em risco, caso precisem receber as provas com portões fechados

Ferrari fans

Foto de: Mark Sutton / Motorsport Images

"Partida com portões fechados". Quantas vezes já ouvimos essa frase saindo da sentença de um juiz desportivo? Mas, claro, estamos falando sobre o futebol, no contexto onde jogar sem a presença do público é uma medida disciplinar tomada como resultado de alguma ofensa.

Os "portões fechados" são sinônimos de condenação, sanção, punição. Em alguns meses (realmente esperamos que sim!), a Fórmula 1 deve retomar suas atividades de pista, mas deve voltar em circuitos desertos, onde a única presença permitida será daqueles estritamente necessários para fazer um GP acontecer.

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Será uma situação inédita para o circo da F1, que deverá cumprir essa regra, apesar de não ter cometido nenhuma ilegalidade. Mas essa imposição é compreensível devido às medidas restritivas relacionadas à situação que estamos enfrentando e, como tal, devem ser respeitadas.

Porém, isso não será uma transição simples para a F1, cujo modelo de negócios tem a presença do público como uma das pedras angulares para a sobrevivência do sistema.

As condiçoes atuais exigem que as decisões sejam tomadas levando como base o que seria "menos pior", e, no momento, a opção de correr com portões fechados é, de fato, a única maneira de iniciar a temporada no verão europeu.

Mas, por quanto tempo a F1 poderá se dar ao luxo de organizar corridas com portões fechados? E, acima de tudo, quais são os GPs que podem bancar uma prova sem a presença do público?

Pierre Gasly, Red Bull RB15

Pierre Gasly, Red Bull RB15

Photo by: Evgeniy Safronov

Templos da F1 em risco

A má notícia (para os torcedores) é que, nessa situação, os locais históricos do mundial são os que mais sofrerão. Estamos falando de circuitos como Mônaco (já cancelado), Monza, Spa, em geral, todas as pistas com GPs promovidos por organizadores que não podem contar com grandes recursos vindos do governo.

Mesmo que sejam inferiores aos custos daqueles que precisam estabelecer um circuito urbano, as pistas permanentes devem, em qualquer caso, alocar fundos significativos para os acessórios necessários para a F1.

O primeiro ponto é que um circuito (como Monza) deve ter certeza de que não pode receber o público pelo menos seis semanas antes do evento, o tempo necessário para montar as arquibancadas.

Este é um número significativo, já que os custos de montagem e desmontagem variam de 25 euros para um local descoberto a 60 para um coberto, por pessoa. Levando em conta o número de espectadores que se reúnem nas diversas arquibancadas (entre 35 e 40 mil no caso da Itália), isso representa uma despesa que varia entre um e 1,5 milhão de euros. Se houvesse um cancelamento de última hora do evento, como aconteceu em Melbourne, seria um banho de sangue para as finanças da pista, que colocaria em risco sua própria sobrevivência.

Valtteri Bottas, Mercedes AMG F1, Race winner Charles Leclerc, Ferrari and Lewis Hamilton, Mercedes AMG F1 celebrate on the podium

Valtteri Bottas, Mercedes AMG F1, Race winner Charles Leclerc, Ferrari and Lewis Hamilton, Mercedes AMG F1 celebrate on the podium

Photo by: Andy Hone / Motorsport Images

Sem público, a ajuda externa se mostra indispensável

Mas, mesmo que tenha sido deixado claro de antemão que o evento será realizado com portões fechados, ainda existem outros grandes problemas que precisam ser superados.

Supondo que a Liberty pare de solicitar a taxa que os organizadores dos GPs geralmente pagam, os custos de ter o circuito pronto permanecem, além dos relacionados ao pessoal essencial para o evento: administradores, equipe interna, segurança, instalações médicas e outras menores. Quem assume isso? A única chance seria da Liberty assumir esses gastos, mas é pouco provável, devido ao momento difícil que todos estão passando.

A falta de público dificulta o caminho do financiamento público, que Monza já desfrutou no passado. De fato, a despesa é um investimento, amplamente reembolsado pelos lucros gerados pelo evento.

Segundo um estudo realizado pela Câmara de Comércio de Monza e Brianza, o efeito direto do Grand Prix do ano passado foi de 24,6 milhões de euros, dividido entre acomodações (8,1 milhões), restaurantes (6,6 milhões), transporte e estacionamento (1,8 milhão), além de compras e outras áreas (8 milhões). Obviamente, tudo isso está relacionado à presença dos espectadores (200 mil no ano passado pelos três dias) e, sem o público, tudo cai.

Valtteri Bottas, Mercedes AMG F1, 2nd position, Charles Leclerc, Ferrari, 1st position, and Lewis Hamilton, Mercedes AMG F1, 3rd position, on the podium

Valtteri Bottas, Mercedes AMG F1, 2nd position, Charles Leclerc, Ferrari, 1st position, and Lewis Hamilton, Mercedes AMG F1, 3rd position, on the podium

Photo by: Jerry Andre / Motorsport Images

Os únicos GPs seguros são os "estatais"

No plano elaborado pela Liberty, FIA e equipes, há a previsão de início da temporada de 2020 em 05 de julho na Áustria, com uma segunda corrida a ser realizada no mesmo local na semana seguinte.

Porém, o Red Bull Ring é uma instalação privada, de propriedade do grupo que é líder no setor de bebidas energéticas, e um tirar dinheiro do próprio bolso para garantir os serviços necessários para realizar essas corridas não é algo que tira o sono do proprietário do local e da empresa, Dietrich Mateschitz.

Nos dias 19 e 26 de julho, a intenção é replicar o roteiro em Silverstone, e, neste caso, especula-se que a Liberty vá arcar com os custos, sendo a corrida "de casa" de 7 das 10 equipes do mundial, o que traria uma economia significativa em termos de logística.

O grande ponto de interrogação é o que acontecerá depois da rodada britânica. A possibilidade da prova da Hungria em sua data original permanece, mas nenhum comentário sobre a questão é feita.

Há outras provas no calendário cujo foco é diferente, Rússia, Azerbaijão, China, Vietnã, Bahrein e Abu Dhabi são eventos garantidos com fundos do governo, alocados para promover a imagem dos respectivos países diante do mundo, através da exploração de um evento mundial.

Nesses casos, a presença do público na pista não é um elemento essencial para a realização do evento. Se tiver, melhor, mas, se não tiver, não é de muita importância. Durante anos, a arquibancada do lado de fora da primeira curva do circuito de Xangai tem sido usada como um outdoor gigante.

No momento, estes são os locais mais seguros para a F1 em caso de emergência, mas a categoria trabalha para garantir que possa realizar o calendário mais completo possível. Os rumores falam de provas fora da Europa entre setembro e dezembro, com as provas no continente americano, Estados Unidos, México e Brasil, em outubro.

A Europa está destinada a pagar um preço alto pelos efeitos da Covid-19, mas, no momento, há algo a mais em jogo além das grandes tradições cimentadas pelas provas históricas em sete décadas de campeonato.

Hoje, o futuro da F1 está em jogo, e, em uma situação de emergência, a prioridade é iniciar a temporada. Se, como esperado, os planos seguirem em frente, as boas novas serão mais importantes que o sacrifício temporário de qualquer circuito, desde que seja apenas um caso excepcional, como o que o planeta inteiro está enfrentando atualmente.

Confira como o coronavírus tem afetado o calendário do esporte a motor pelo mundo

Uma das primeiras aparições do coronavírus no esporte a motor veio com o adiamento da etapa de Sanya, da Fórmula E.
A Fórmula 1 adiou o GP da China pelo mesmo motivo.
Com o crescente aumento de casos do Covid-19, o GP do Bahrein chegou a ser confirmado, mas sem presença de público.
A MotoGP, a maior categoria das duas rodas do mundo, chegou a realizar a primeira etapa no Catar, mas apenas com a Moto2 e Moto3.
Mais tarde, as etapas da Tailândia, Estados Unidos, Argentina, Espanha e França também foram suspensas, com adiamento
No início de abril, a MotoGP confirmou também o adiamento dos GPs da Itália e da Catalunha, dois dos países mais afetados pela pandemia, além do GP da Alemanha. A etapa da Holanda, em 28 de junho, é, atualmente, a primeira etapa do ano
A Fórmula E anunciou a suspensão da temporada por dois meses: os ePrix de Paris e Seul foram adiados.
Em abril, a Fórmula E confirmou a extensão da paralisação do campeonato até o final de junho e o adiamento do ePrix de Berlim. As provas de Nova York e Londres se tornaram dúvidas
O GP da Austrália de F1 estava previsto para acontecer, com presença de público e tudo.
Um funcionário da McLaren testou positivo para o Covid-19 e a equipe decidiu não participar do evento.
Lewis Hamilton criticou a decisão da categoria, dizendo que era chocante todos estarem ali para fazer uma corrida em meio à crise do coronavírus.
Após braço de ferro político entre equipes e categoria, a decisão de cancelar o GP da Austrália veio faltando cerca de três horas para a entrada do primeiro carro na pista para o primeiro treino livre.
Pouco tempo depois, os GPs do Bahrein e Vietnã também foram adiados.
Os GPs da Holanda e Espanha também foram postergados.
Uma das jóias da Tríplice Coroa, o GP de Mônaco, foi cancelado. Poucos dias depois, o GP do Azerbaijão também foi adiado
O GP do Canadá também teve seu adiamento confirmado no início de abril. Agora, o GP da França é o primeiro do calendário, e está marcado para 28 de junho
Para atenuar os efeitos de tantas mudanças no calendário, a F1 decidiu antecipar e aumentar, as férias de verão, indo de 14 para 35 dias
Além disso, FIA e F1 concordaram em introduzir o novo pacote de regulamentos que entrariam no próximo ano, a partir de 2022. Mas, segundo Christian Horner, há um movimento para adiar em mais um ano, para 2023, em preparação ao impacto que o Covid-19 terá na economia mundial
Acompanhando a F1, a F2 e F3 também anunciaram suas primeiras provas como adiadas.
Outras categorias e provas nobres do calendário do automobilismo mundial também foram prejudicadas pelo coronavírus.
As 24 Horas de Le Mans foi adiada para 19 de setembro.
A etapa conjunta entre WEC e IMSA em Sebring foi cancelada e o WEC revisou seu calendário, jogando o final da temporada para novembro de 2020, com a próxima temporada iniciando apenas a partir de março de 2021
O tradicional TT da Ilha de Man foi cancelado.
A Indy suspendeu as primeiras corridas em St Pete, Alabama, Long Beach e Austin.
Na teoria, o campeonato começa no dia 6 de junho, no Texas. O circuito misto do Indianápolis Motor Speedway abrigará duas corridas, a primeira no dia 4 de julho e a segunda em 3 de outubro. Laguna Seca também ganhou uma rodada dupla e St. Pete deve fechar a temporada, ainda sem data
As 500 Milhas de Indianápolis será no dia 23 de agosto.
Na NASCAR, a maior categoria do automobilismo dos EUA, foram realizadas as primeiras quatro provas, mas a categoria espera retomar as atividades no final de maio
No Brasil, a CBA suspendeu as atividades no país por tempo indeterminado.
A Stock teve que adiar a abertura do campeonato, com a Corrida de Duplas. Etapas do Velopark e Londrina também foram adiadas.
A Porsche Cup realizou apenas sua primeira etapa em Interlagos e aguarda novas diretrizes para retomar o campeonato.
Endurance Brasil, Copa Truck, entre outras competições, também estão paralisadas.
Uma saída encontrada pelos campeonatos durante esse período de paralisações foi a realização de eventos virtuais. Fórmula 1, Indy, NASCAR, MotoGP, entre outros, estão organizando campeonatos para animar os fãs nesse período de quarentena
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