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Coluna do André Negrão: de 'ponta-cabeça' em Le Mans

Piloto brasileiro da equipe Alpine na classe principal do WEC, colunista fala sobre os desafios de guiar um hipercarro em La Sarthe

Andre Negrao

Andre Negrao

Nikolaz Godet / Motorsport.com

Pessoal, nesta primeira coluna para o Motorsport.com, gostaria de contar para vocês um pouco sobre uma das maiores novidades para mim em 2021: o Alpine A480 LMP1, com o qual vou disputar tanto o WEC (Campeonato Mundial de Endurance) quanto Le Mans neste ano.

Por estar com ele na principal categoria de endurance do mundo, com a equipe oficial da Alpine, é um carro que tem potencial de ser o mais importante de toda a minha carreira. E ele é bem interessante.

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Na semana em que estive na sede da equipe, na França, fizemos alguns cálculos e descobrimos que, se houvesse um túnel que possibilitasse que o carro subisse por suas paredes e chegasse ao teto, o Alpine A480 seria capaz de andar de ponta-cabeça ao atingir apenas 160km/h.

Só esse dado impressionante já dá a noção exata do excelente nível de eficiência aerodinâmica atingido pela engenharia no desenvolvimento do A480, um carro de 900kg. E, depois de saber dessa informação, é impossível para mim, como piloto, não imaginar a ideia de ter um túnel que permitisse essa façanha em Le Mans, no circuito de La Sarthe, onde atingimos as maiores velocidades no WEC.

Mais veloz

O Alpine A480 acelera muito mais do que isso. No ano passado, competindo com um carro da LMP2 – uma categoria abaixo da que vou disputar em 2021 – nós já chegamos a 344km/h na reta Hunaudieres de Le Mans. Com o Alpine A480, vamos tranquilamente superar os 350km/h.

'Grudar' tanto na pista, como na brincadeira do túnel, é sem dúvida uma virtude do A480. Mas isso não o torna um carro fácil de pilotar – 'dirigir' é fácil, pilotar é outra coisa. Por exemplo, o principal problema de um motorista comum com este carro seria sair do lugar. Só o fato de a embreagem ser acionada manualmente já eleva muito a sensibilidade. Claro, há sempre o risco de despejar de vez os 625cv do motor, um V8 aspirado de 4,5 litros fabricado pela Gibson.

Mas, com um pouco de treino – e talvez uma embreagem reserva (risos) –, acho que qualquer um com alguma noção levaria o A480 do box para a pista. Aí é que começa a parte mais divertida – e também o principal desafio.

O Alpine A480 não tem ABS, mas tem controle de tração. Então, se você quiser apenas passear, vai ficar na pista sem problemas. Mas, para chegar ao limite – ou até à metade dele –, vai ser preciso alguma habilidade.

Por exemplo, na LMP2, nós chegamos a 3,8 G de força lateral nas pistas de Spa-Francorchamps e Fuji, o que equivale a ter quase quatro vezes a força da gravidade te empurrando de lado no meio da curva. Isso não é algo fácil de lidar, porque, embora seu corpo esteja bem preso pelos cintos de segurança, é preciso um esforço especial para manter cabeça, braços e pernas no lugar.

Descoordenação

A situação é também algo que 'brinca' um pouco com o seu cérebro. Pois, ao mesmo tempo em que tem que controlar o carro em alta velocidade na curva – e talvez tentar passar alguém –, você precisa conviver com a descoordenação anormal causada pela força G lateral, a fim de manter o corpo no lugar e fazer os movimentos necessários. 

Os pilotos conseguem fazer isso porque treinaram a vida toda para esse momento – e também fazem uma preparação física específica para os músculos de sustentação dos membros. Por isso, é comum haver pilotos com a musculatura do pescoço especialmente reforçada, pois a cabeça é a parte do corpo que mais pesa nessa situação – dores e lesões no pescoço costumam acontecer.

Para um novato, um pouco menos incômoda seria a força G gerada na frenagem, que é a característica que considero mais legal na pilotagem desse carro. Embora ela seja mais fácil para o cérebro lidar, pois é algo esperado quando se está acima dos 300km/h e se freia para entrar em uma curva de 70km/h, a repetição pode cansar e também causar dores, caso você não esteja preparado.

Centenas de 'coices'

Há uma diferença grande entre o LMP1 que vou usar em 2021 e o LPM2 com o qual eu corri até o ano passado. Os discos e pinças de freio são muito maiores no novo carro e, andando em ritmo de corrida, você leva um 'coice' bem forte nas freadas. Faça isso centenas de vezes, como é o nosso caso numa corrida de 24 horas, e o resultado pode ser uma semana de cama a partir do dia seguinte.

Uma coisa que chama a atenção e dá um bom trabalho nos carros como o A480 são os controles. No volante, por exemplo, temos diversos: mistura de combustível, controle de tração variável (você pode usar mais controle no piso molhado e menos no seco, por exemplo), faróis, acionamento do motor, vários ajustes pré-estabelecidos pela equipe e feitos pelos botões que são previamente programados para situações de chuva, largada, menor consumo, etc.

No painel, também temos vários botões que controlam itens como potência do volante (algo importante em uma prova longa), balanço dos freios, extintor de incêndio e vários outros ajustes que são mais usados pelos técnicos da equipe do que pelos pilotos.

No fim das contas, é divertido pilotar um carro como o A480. Pelo que escrevi acima, pode parecer que você precisa ser um supercomputador para lidar com tantos controles, força G a toda hora e ainda brigar por posições. E é verdade que é preciso decorar os comandos e treinar para saber acioná-los. Mas, na hora da ação, vem tudo instintivamente. A Alpine fez um ótimo trabalho com esse carro. Por isso, não vejo a hora de começar a temporada.

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