Análise

F1 enfrenta desafio com transmissões em TV aberta versus fechada e audiência global; saiba papel do Brasil nesse cenário

A disputa intensa na F1 entre Hamilton e Verstappen já provou ser um sucesso entre os fãs, com vários países registrando um aumento de audiência

Max Verstappen, Red Bull Racing, 2nd position, is interviewed by Jenson Button, Sky TV, after the race

Foto de: Andy Hone / Motorsport Images

Com a Fórmula 1 a caminho de seu importante evento em Mônaco, que regularmente é uma das corridas mais assistidas no ano (exceto na última temporada quando não aconteceu), todas as indicações apontam para mais uma alta audiência.

Mas a perspectiva da F1 entregar uma das batalhas mais apertadas pelo título dos últimos anos, reabriu o debate sobre uma possível perda que o esporte tenha ao restringir sua exibição às TVs a cabo em vários países.

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Falando recentemente sobre o foco da F1 na TV a cabo, Lewis Hamilton disse: "Eu entendo as pessoas que não podem pagar TV a cabo, Sky ou qualquer coisa do tipo. Mas é o modo como o mundo está hoje, e infelizmente não há muito que podemos fazer sobre isso".

Porém, o debate sobre os prós e contras da TV aberta versus a fechada não é novo, e divide fãs particularmente no Reino Unido desde a primeira transmissão de F1 da Sky em 2012. Por anos, o argumento simplesmente focou em entender se o preço da queda nas audiências de TV valiam o dinheiro extra investido por essas transmissões fechadas.

Mas, a realidade é que as ameaças e oportunidades oferecidas pela TV a cabo oferecem nuances muito maiores que apenas os números das transmissões de domingo.

Os benefícios extras da TV a cabo

Simon Lazenby, Sky TV, on the grid prior to the start

Simon Lazenby, Sky TV, on the grid prior to the start

Photo by: Mark Sutton / Motorsport Images

É amplamente aceito que os números de audiência da F1 na TV atingiram um pico em 2008, quando houve um registro de 600 milhões de telespectadores naquele ano.

A transição gradual para a TV a cabo, que se intensificou a partir disso, viu os números caírem para 490 milhões em 2018, 471 em 2019 e 433 milhões em 2020, mas é importante considerar o impacto da Covid-19 no ano passado, com a redução do calendário.

Mas enquanto essa tendência foi vista globalmente, alguns mercados estão bem. Os Estados Unidos registraram um recorde neste ano, e mesmo em 2020, com corridas exclusivamente na Europa e na região do Golfo, em fusos horários que não beneficiam a região, foi registrado um crescimento de 1%.

Não há argumento de que a F1 entregaria audiências maiores no geral caso voltasse a ser transmitida apenas em TV aberta. Mas uma mudança e números mais vistosos seriam benéficos em geral para o esporte?

Isso é algo que o diretor de direitos de mídia da F1, Ian Holmes, é particularmente cético.

Enquanto ele reconhece que a TV aberta sempre trará um público maior que as transmissões na TV a cabo, entender de fato qual é a melhor opção para o esporte é algo muito mais complexo.

Há outros fatores, como a cobertura dedicada, e o marketing tremendo que redes como a Sky [no Reino Unido] fazem para promover as transmissões de F1 e, tudo isso, aumentam a exposição geral do esporte.

"Não há ponto em comparar aberto com fechado", disse. "O que descobrimos, e isso não acontece apenas com a Sky porque pode se aplicar a outros como o Canal+ na França, uma plataforma madura de TV paga, é a quantidade de marketing que eles colocam junto de seus direitos, como eles entregam o conteúdo. É algo que vai muito além de suas audiências".

"Tivemos mais exposição que nunca antes mesmo que a temporada começasse em nosso primeiro ano com a Sky. Lembro de andar por aí e ver outdoors enormes em todos os lugares. Nunca tivemos isso antes".

"É algo que vai muito além de 'qual é a audiência?'. É como eles apoiam o esporte. Como eles vão vender o esporte? Quanto tempo eles darão ao esporte. E, no final, precisamos olhar para a temporada como um todo".

"Se você começar com uma comparação de audiência de uma transmissão ao vivo, claro que será menor. Mas aí entra: como que essa audiência crescerá e desenvolverá ao longo do ano?".

"É algo com mais nuances do que apenas TV aberta ou fechada. Vamos encarar a realidade, além dos eventos como Olimpíadas, Copa do Mundo e Eurocopa, quase não há transmissões esportivas na TV aberta. E há uma razão para isso".

Mercados diferentes

Lewis Hamilton, Mercedes W12, Max Verstappen, Red Bull Racing RB16B, Valtteri Bottas, Mercedes W12, Charles Leclerc, Ferrari SF21, and the rest of the field away at the start

Lewis Hamilton, Mercedes W12, Max Verstappen, Red Bull Racing RB16B, Valtteri Bottas, Mercedes W12, Charles Leclerc, Ferrari SF21, and the rest of the field away at the start

Photo by: Jerry Andre / Motorsport Images

Para a F1, ter uma presença completa em uma plataforma comprometida como a Sky, que pode oferecer horas e horas de cobertura e uma exposição impossível na maioria dos canais de TV aberta, traz claros benefícios, para equipes, patrocinadores e fãs, algo que vai além do impacto financeiro de um acordo que vale 1 bilhão de libras (aproximadamente R$7,5 bilhões) ao longo de seis anos.

Mas, isso não significa que a F1 não busca a plataforma que pagar mais em cada país. Quando faz acordos, quer garantir que tenha junto um trabalho para o esporte que vai além do básico.

Claro, um acordo com TV fechada entregará uma queda de audiência nos domingos em comparação com os números da TV aberta, mas é o impacto ao longo de uma temporada inteira que importa.

E, em alguns mercados, o impacto da TV fechada seria tão grande que mudar de plataformas não seria bom para a F1. Com isso, é melhor ficar nos canais abertos.

"Talvez tenhamos uma posição diferente em um mercado em desenvolvimento em comparação com os desenvolvidos", explicou Holmes. "Podemos ter visões diferentes para locais como Singapura e Índia, um mercado muito pequeno e outro massivo".

Além disso, os acordos devem pesar também um pacote extra de conteúdo digital e, certamente, se a própria plataforma da F1, a F1TV, poderá ser oferecida para o público daquele país.

Conteúdo digital

Karun Chandhok, Sky TV, Jenson Button, Sky Sports F1, and Simon Lazenby, Sky TV, on their socially distanced platform

Karun Chandhok, Sky TV, Jenson Button, Sky Sports F1, and Simon Lazenby, Sky TV, on their socially distanced platform

Photo by: Mark Sutton / Motorsport Images

Nestes dias, você não pode julgar o apelo do esporte única e exclusivamente através de seus números de audiência das transmissões ao vivo. Os olhos da televisão são apenas uma métrica para considerar a popularidade do esporte, e os fãs da F1 estão mais engajados do que nunca com a categoria devido ao extenso acesso a conteúdos que eles possuem atualmente.

Enquanto uma vez no passado Bernie Ecclestone descartava qualquer sugestão da F1 entregando conteúdo gratuito nas mídias sociais, no reinado da Liberty Media, a abordagem mudou da água para o vinho.

Um plano agressivo em plataformas como Facebook, Twitter, Instagram e TikTok ajudou a F1 a se tornar o segundo esporte em termos de crescimento no mundo, apesar de partir de uma base baixa, remando para recuperar o tempo perdido.

Com quase cinco bilhões de visualizações no ano passado, equipes, pilotos e patrocinadores estão recebendo mais espaço do que nunca.

E em vez de marginalizar as redes sociais, vistas antes como negativa, potencialmente tirando dos fãs a necessidade de assinar uma TV a cabo, a visão da F1 atual é que, na verdade, está sendo um benefício, atraindo uma audiência diferente.

"Há muitas evidências que sugerem que o conteúdo que nós ou qualquer outro publica complementa os direitos que nossos parceiros de transmissão pagam", disse Holmes.

"Todas essas são expressões de marketing do topo do funil e, tudo isso é absolutamente essencial. E há uma parte das pessoas, muitos dizem que a fatia mais jovem, mas não precisa necessariamente eles, que não vão sentar assistir uma corrida de qualquer jeito".

"Então você não está tirando os olhos do que acontece ao vivo na corrida. O que você está fazendo é convertê-los. Acho que todos reconhecem o valor disso".

O impacto de Brasil e Alemanha

Lewis Hamilton, Mercedes AMG F1 W10 leads Max Verstappen, Red Bull Racing RB15, Sebastian Vettel, Ferrari SF90 and Alexander Albon, Red Bull RB15 at the restart

Lewis Hamilton, Mercedes AMG F1 W10 leads Max Verstappen, Red Bull Racing RB15, Sebastian Vettel, Ferrari SF90 and Alexander Albon, Red Bull RB15 at the restart

Photo by: Andy Hone / Motorsport Images

Por outro lado, este ano marca duas mudanças muito significativas no mapa de TV da F1, com os importantes mercados alemão e brasileiro mudando de canais.

Ambos os exemplos mostram porque apenas olhar para os números de audiência nas transmissões de domingo não fornecem insights perfeitos sobre os prós e contras das mudanças.

Na Alemanha, o canal aberto RTL não está mais transmitindo todas as corridas ao vivo, optando por exibir apenas quatro ao longo do ano, com a Sky ficando responsável pela temporada.

O fim do acordo com a RTL foi grande para a Alemanha, mas Holmes disse que a realidade da queda de faturamento com patrocínios na TV aberta significou que não fazia mais sentido manter a parceria.

"O que vimos ao longo dos últimos nove anos com as nossas renovações da RTL refletem onde a televisão aberta está em termos de pagamentos pelos direitos. Com cada renovação, o valor foi caindo".

"Eles são um negócio, e não conseguem vender suas cotas de publicidade pelos números que conseguiam. Com a publicidade, enquanto o valor total dedicado segue o mesmo, ele está sendo redistribuído em diferentes áreas, com o digital representando uma grande fatia atualmente".

A F1 também sentiu que o mercado alemão estava pronto para a mudança à TV fechada, com a Sky Alemanha tendo melhorado sua penetração no mercado de mídia local.

Então enquanto a F1 aceita que os números da Alemanha tenham uma queda nos eventos não exibidos pela RTL, o conteúdo extra sendo exibido como parte do acordo com a Sky Sports News, que incluem também a ARD e a ZDF, cria um balanço em termos de exposição ao longo do ano.

No Brasil, a F1 mudou da Globo, sua parceira de quatro décadas, para a Bandeirantes, outro canal de TV aberta, mas com penetração do mercado. Para a categoria, esse era um mercado onde não fazia sentido passar para a TV fechada.

"O Brasil é um mercado em que consideramos importante demais em termos de audiência para considerarmos sequer uma mudança parcial para TV fechada".

"E o que a Bandeirantes não possui em termos de presença de mercado comparado à Globo, seu apetite pelos direitos de transmissão foi significativo. A Globo possui apenas um canal, e precisamos competir com as novelas, que entregam audiências enormes, o que é difícil".

"A Bandeirantes nos dá um comprometimento muito maior, transmitindo todas as corridas e classificações no ano. A Globo não exibia uma corrida ao vivo do continente americano, exceto o Brasil, há anos".

"Para todas as classificações, eles mostravam apenas dois a quatro minutos dentro de outro programa. Então agora temos todas as corridas e classificações ao vivo na TV aberta com a Bandeirantes".

"E a Bandeirantes ainda possui o BandSports, e eles exibem todos os treinos livres, além da F2 e da F3, o que é muito importante. E para ajudar ainda mais o fã da F1, pudemos liberar o F1TV  no mercado. Não estava disponível para esse mercado antes".

"Em um mercado em que o tamanho não vai mudar significativamente a exposição no geral, podemos oferecer uma oportunidade adicional de visualização para o fã ávido".

"Então ponderando Alemanha o tamanho do Brasil, eles definitivamente reduzirão os números um pouco, mas se isso significará que, globalmente, estaremos abaixo em comparação com o ano passado, não tenho certeza. Os indicadores em outros locais são muito bons".

Aceitação maior

Daniel Ricciardo, McLaren MCL35M, Nicholas Latifi, Williams FW43B, Mick Schumacher, Haas VF-21, and Nikita Mazepin, Haas VF-21, chase the pack at the start

Daniel Ricciardo, McLaren MCL35M, Nicholas Latifi, Williams FW43B, Mick Schumacher, Haas VF-21, and Nikita Mazepin, Haas VF-21, chase the pack at the start

Photo by: Zak Mauger / Motorsport Images

Algo muito importante que precisa ser compreendido é que os negócios de TV, e, especialmente, as atitudes dos consumidores sobre pagar por conteúdo, mudou drasticamente nos últimos anos.

Se, em um momento, os fãs criticavam a possibilidade da F1 não estar na TV aberta, a grande popularidade de Drive to Survive em uma plataforma paga mostra que o conteúdo não precisa ser gratuito para ser bem-sucedido.

A maior disposição das pessoas a pagarem por conteúdo de qualidade, especialmente com canais de TV a cabo buscando uma exclusividade cada vez maior, parece ter criado um momento positivo a partir dos números de audiência da Sky no Reino Unido.

Enquanto o Channel 4 transmitia corridas regularmente em 2018, atraindo cerca de 2 milhões por prova, a Sky traz menos de um milhão. No GP do Bahrein deste ano, a Sky entregou a maior audiência até aquele ponto, com 1,98 milhão de média e um pico de 2,23.

Há sinais também de crescimento em mercados-chave. No ano passado, a F1 teve um crescimento de 43% na China, 28% na Holanda e 71% na Rússia.

Os tempos estão mudando

Martin Brundle of Sky TV commentates on Lando Norris, McLaren MCL35M

Martin Brundle of Sky TV commentates on Lando Norris, McLaren MCL35M

Photo by: Mark Sutton / Motorsport Images

Do mesmo jeito que o desenvolvimento de um carro de F1 nunca para, o modelo de negócios da categoria para a TV também precisa mudar constantemente.

Olhando para a próxima década, é difícil de prever se estaremos assistindo F1 na TV aberta, fechada, Amazon, Netflix, YouTube, F1TV, ou em sites como o Motorsport.com ou mesmo em plataformas dedicadas como o Motorsport.tv. E podemos ir além: é possível que estejamos assistindo em algo que ainda não existe neste momento.

Mas uma coisa segue verdadeira: o esporte de ponta é perfeito para a televisão ao vivo e com essa atratividade vêm as emissoras querendo pagar bem por isso. Somente isso já é uma grande injeção de ânimo para a saúde a longo prazo da F1.

Perguntado sobre como ele vê o futuro dos negócios de TV ao longo da próxima década, Holmes disse: "Eu vejo ainda um cenário em que o esporte é um conteúdo importante".

"Há muito valor na experiência ao ao vivo. E não há muito por aí que necessita de uma transmissão ao vivo. Então chamaria de Premium Plus. As pessoas buscarão isso e, com isso, acaba retendo valor".

"Então, o que é mais importante para nós, é garantirmos que o conteúdo seja tão bom quanto é possível. E, por isso, quero dizer que tenha aquele conteúdo, direto da pista, que outras pessoas mais inteligentes que eu estejam supervisionando. Ou seja, bom regulamento, como os carros são construídos e a natureza competitiva das corridas".

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