Análise

ANÁLISE: Em meio ao boom do ChatGPT, dá pra pensar na inteligência artificial assumindo a estratégia na F1?

Experimentos feitos pela McLaren e sua parceira, Splunk, na equipe de eSports, pode ser um norte para o futuro

Lando Norris, McLaren MCL36, in the pits

Foto de: Steven Tee / Motorsport Images

O sucesso do ChatGPT nas redes sociais desde o seu lançamento levantou as discussões sobre a Inteligência Artificial para novos patamares. Isso também fez com que muitas áreas da indústria passassem a avaliar o impacto que o avanço da IA terá sobre elas nos próximos anos, tanto em termos de como explorar isso com sucesso e se pode substituir a força humana.

A Fórmula 1 não é diferente, com as equipes já usando a inteligência artificial em uma grande gama de atividades, incluindo ajustes do carro, direção de desenvolvimento e distribuição de recursos. Ela tem um papel no planejamento das estratégias de corrida, e levantou debates sobre a possibilidade dos robôs assumirem completamente o pitwall.

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Após um 2022 que provou mais uma vez o papel fundamental de uma estratégia para vencer na F1, e o quão alta pode ser a penalização caso o pitwall erre, fica clara a atração por um modelo bem sucedido de IA.

Até porque, a IA não sucumbe sob pressão. Em teoria, entrega as respostas corretas com base na avaliação de um conjunto de dados maior que qualquer ser humano pode estudar, e nunca se preocuparia com o que a imprensa poderia escrever sobre ela no dia seguinte. Mas, o que parece simples em teoria é, na verdade, muito mais difícil no mundo real.

As oportunidades e desafios são algo que a McLaren vem entedendo recentemente, através de atualizações para melhorar sua própria estratégia e software.

McLaren Shadow Esports team

McLaren Shadow Esports team

Mais interessante ainda é o trabalho que a equipe de Woking vem assumindo com a nova parceira técnica, a Splunk, para sua equipe de eSports, que permitiu à McLaren experimentar um pouco mais com novas ideias de estratégia e o uso potencial da IA.

Desde a sua chegada à McLaren no começo de 2020, a Splunk vem ajudando a equipe com softwares capazes de pesquisar, monitorar e analisar dados gerados pelas máquinas em vários aspectos da operação de corrida.

Uma área de sucesso é nos sistemas de simulação, e especialmente na entrega de ferramentas para o ao vivo, como o famoso traçado de corrida, que é agora essencial para compreender o ritmo de um GP e planejar as melhores decisões de parada para vencer.

No ano passado, com a McLaren Shadow Esports Team se esforçando para vencer o título da F1 Esports Series, a Splunk adaptou uma versão de sua ferramenta de estratégia da F1 para vencer. E foi essa habilidade, tendo a pronta entrega o tipo de dados e software que a equipe no pitwall durante as corridas da F1, como degradação de pneus, análise e previsão de undercut e overcut, que provou ser fundamental em suas ambições.

Lucas Blakeley terminou com o campeonato pela primeira vez, e não teve vergonha em dizer que o software de estratégia da Splunk foi importante para seu sucesso.

"Esse nível extra de profundidade que tivemos graças à Splunk, eu seguirei dizendo: é uma das coisas mais legais que já usamos. Nos deu uma perspectiva, uma camada extra. Uma flecha extra para usar se quiser".

Da perspectiva da McLaren, o valor era claro, como explica Ed Green, diretor de tecnologia comercial da McLaren Racing: "Mudou o jogo. Acho que foi fundamental nas vitórias que obtivemos, levando ao título".

Com o sistema da Splunk tornando-se peça fundamental na equipe de eSport, isso abriu caminho para experimentações, que não seriam possíveis em um ambiente regular de fim de semana de GP.

James Hodge, vice-presidente e conselheiro-chefe de estratégia da Splunk, disse: "Há mais que pode ser feito no eSport em termos de desenvolvimento rápido. Os riscos são diferentes. Se você tocar em qualquer coisa na F1 real, você está quase que lidando com um sistema quase de missão crítica. Se o carro da F1 não está recebendo a telemetria da garagem da McLaren, eles não podem ligar o motor".

"Já no eSport, as implicações são menores: se você não tem a telemetria, se ela não funciona, sabe que Lucas ainda pode guiar. E a complexidade é menor. Você não está mexendo toda a operação para 20 locais diferentes ao redor do mundo".

"Então isso te permite melhorar rapidamente os protótipos. Pudemos testar coisas nos games que levariam um ano para serem feitos no mundo real, pelo fato de você ter uma grande equipe que precisa mudar o modo de trabalhar para se adaptar àquele novo painel de análise".

Lucas Blakeley, McLaren Shadow Esports team

Lucas Blakeley, McLaren Shadow Esports team

Green acrescenta: "O que a Splunk nos permite a fazer é meio que copiar a realidade, rapidamente, sem precisar de uma sala cheia de pessoas com grande expertise. E acho que a velocidade na qual estamos desenvolvendo com a Splunk, parte disso está voltando para a equipe de F1. Eles estão vendo um pouco do que estamos fazendo e ficando surpresos com a velocidade".

A habilidade de testar muito com o eSport, com os parâmetros de performance do carro sendo tão similares ao mundo real, inevitavelmente abriu as portas para ver qual papel a IA pode ter nas decisões de estratégia.

Green cita o programa AlphaGo, desenvolvido pela DeepMind, subsidiária da Google, que conseguiu derrotar um humano no jogo de Go, é um exemplo de como que a IA correta pode superar a mente humana.

"É interessante o que aconteceu no Go. O quão longe podemos levar isso no esporte? Pode ser uma inspiração real e, em un nível pessoal, adoraria ver uma equipe de estratégia de IA algum dia".

Por enquanto, a Splunk acredita que a tecnologia esteja apenas em um estágio na qual pode oferecer certa ajuda no processo de tomada de decisão, em vez de ter o poder.

"O que estamos fazendo é analisar qual é a probabilidade de alguém parar com base em sua performance", disse Hodge. "Você pode começar a ver a degradação no tempo de volta, então provavelmente o piloto entrará em sua janela de box".

"E é nesse ponto que estamos. Ainda não estamos na condição de prever tudo de uma corrida. Mas definitivamente estamos ajudando no processo de decisão".

Green concorda que permitir que a IA comande o show é algo pouco realista para o momento.

"Se já estamos lá hoje. Não. Se algum dia teremos uma IA tomando a decisão de quando entrar nos boxes? Bem, há alguns momentos em que você vê que é hora de parar, assim como há a linha amarela pontilhada [na pista] que nos mostra a entrada dos boxes".

"Mas há muito parâmetros. São 20 pilotos no grid, você tem variantes diferentes, os estilos de pilotagem, e as pessoas não executam e se comportam como você espera. Os pilotos são muito bons, mas eles vão mudar suas linhas, há o elemento de competição. Então acho que precisamos entender mais sobre os parâmetros que podemos coletar para realmente entender isso".

"E, se a IA está dizendo a você, que você está vencendo a corrida mas quatro voltas antes do fim você terá que trocar os pneus, você confiaria o suficiente para cumprir essa decisão? Quem sabe? Mas não acho que já estamos lá".

Pitwall McLaren

Pitwall McLaren

Photo by: Erik Junius

Há também outro fator crítico em jogo aqui: por questões de entretenimento, a F1 deve permanecer mais como um esporte do que somente um exercício completamente técnico. É por isso que os pilotos devem guiar o carro "sozinhos e sem auxílio" em termos do uso de sistemas automáticos para ajudar no que vem consistentemente sendo censurado.

Talvez tais restrições precisam ser implementadas também para as decisões de pitwall, porque parte da atração pelo trabalho em equipe na F1 é que, algumas vezes, os humanos erram, e isso ajuda a tornar as coisas imprevisíveis.

Como Hodge disse: "Eu jogo com games de corrida. Não sou bom nisso, mas fico feliz. Se há uma IA que estou correndo contra, você não fica tão satisfeito. Não há aquele drama, aquela comemoração por ter superado um computador. Gosto mais de correr contra outras 19 pessoas que nunca conheci, porque tem o elemento humano. Há um esporte por trás".

"É por isso que não acho que chegaremos a uma era totalmente da IA. É uma das razões pela qual você ainda precisa de Lando [Norris] ou Oscar [Piastri] apertando botões na F1. Você ainda precisa dos elementos esportivos e certas habilidades para criar o drama, a teatralidade ou os heróis e vilões".

E o que o ChatGPT pensa disso? Esse repórter perguntou se seria possível escrever o código para um plano de estratégia de corrida na F1.

A resposta foi: "Infelizmente, escrever um código para um plano de estratégia de corrida na F1 seria uma tarefa complexa, por envolver fatores como a condição climática e da pista, escolha de pneus, performance do carro, competição, etc...".

Parece que não.

Zak Brown, McLaren Racing CEO on the McLaren pit wall gantry

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